Os calundus
conectavam não só o mundo dos homens com o dos ancestrais e espíritos da
natureza, como o Brasil com a África. A palavra é quimbundo, língua falada por
povos da região de Angola, e remete a um sentido de doença proveniente da
intervenção de um ancestral na vida de um descendente seu (Mariana de Mello e
Souza).
O
africano escravizado no Brasil veio de diversas etnias do continente africano,
em grande massa. Chegou ao Brasil a um processo de quatro grandes
ciclos, o século XVI, o século XVII, o século XVIII e o inicio do século XIX.
No decorrer do primeiro século no
Brasil, ate o fim do ciclo desse tráfico que duraram quatro séculos, chegaram
escravos de diversas regiões da África negra. Aqui pisaram principalmente príncipes,
princesas, sacerdotes, sacerdotisas e negros já escravizados de diversas
etnias, aqui se uniram em objetividade de uma única realização, a liberdade.
Os
negros criaram o Brasil, do inicio do comercio ao fim do trafico escravo, sendo
hoje, continuo a manutenção da tradição afro-bantu, afro-nagô, afro-daoméana e
afro-brasileira; essa ultima aqui criada com a diversidade cultural dos
indígenas e dos europeus, pelos descendentes de africanos. Construíram ruas,
pontes e igrejas, levantou uma arquitetura portuguesa; isso pode ser visível
atualmente no século XXI nas cidades históricas.
Organizaram
no Brasil, ou seja, transformaram o Brasil em uma cultura afro-brasileira. Essa
organização se originou principalmente de um processo de trocas culturais entre
os mais diversos e diferentes grupos éticos do continente africanos. Muitos dos negros que eram inimigos em suas
terras natais se viram em necessidade de unir força, esquecer as diferenças e
brigarem em um único lado, o próprio, contra a escravidão e maus tratos dos
colonizadores no Brasil.
Dessas
uniões entre os africanos, precisamente os primeiros negros bantu, escravizados
nesta terra junto a outros povos, estes os próprios habitantes desta terra (que
os portugueses apelidaram como índios), nasceram entre os negros, mesmo sendo
impossível de prolongar-se, a persistência do desejo de viver.
Os
portugueses ao desembarcarem no atual Brasil, perceberam que os nativos,
descendentes dos primeiros habitantes a mais de 1.500 anos atrás, que
aparentavam com os indianos por conta da sua cor de pele, cabelos e seus olhos
puxados, os apelidaram de índios.
A
história persiste viva no subconsciente das comunidades afro-brasileira, como
se tivesse a sua presença meio turva, obstruindo a visão dos indivíduos de quebrarem
as algemas do pré-conceito implantado pela colonização.
Muitos
brasileiros no “novo mundo acidentado” crer em uma historia deturpada com
relação às coerentes historias resgatada pela ciência arqueológica, antropológica
e histórica.
A
verdadeira historia pode ser encontrada nos arquivos coloniais, de processos de
crimes, de inventários, de registros paroquiais de batismo e casamento, entre
muitos outros arquivos como; correspondências oficiais, poesias, narrativas de
viagens, relatos dos missionários e administradores como outras, que pode ser estudadas para compreender que a
historia tem outra versão, uma versão coerente.
Segundo
Mariana de Mello e Souza, por meio dos registros feitos pelo tribunal da
Inquisição, é possível, como foi possível por vários antropólogos, saber que no
século XVIII eram feitos Calundu em torno de altares e lideres religiosos, que
se utilizava de tambores, músicas, objetos variados e gestos cheios de
significados ritualísticos. Mas de acordo com os estudos das pesquisas mais a
fundo, do Antropólogo Luiz Mott, a presença do Calundu é datada desde o ano
1591.
O
Calundu é a mais antiga pratica religiosa dos negros de origem Bantu, no
Brasil. A data registrada pela Inquisição, e, revelada por Luiz Mott, em
denuncia da pratica de feitiçaria de um negro, no Brasil, conhecido como
Francisco Manicongo, nos revela que desde a chegada dos negros escravizados ao
Brasil, se pratica suas tradições religiosas.
Segundo
Luiz Mott, essa presença se deu de primeira descoberta, da atuação de um
sacerdote “Quimbanda”, cuja escrita original na lingua Kimbundu é “Kimbanda”,
na cidade de Salvador, Bahia. Esse Sacerdote é conhecido como Francisco
Manicongo, cuja profissão religiosa como Kimbanda, é equivalente ao maior
titulo de sacerdócio no Candomblé, conhecido como Tata ria Nkisi.
Foi
justamente no ano 1591, quando a primeira visita do Santo Oficia na Bahia,
recebeu uma denuncia que o Francisco Manicongo, escravo de Antonio Pires, tinha
fama de somitigo, e logo sendo pego com uma peça de pano cingido, da mesma
forma como na terra do Kongo (Congo) são usadas por outros Kimbanda ou
Nganga-ia-Kimbanda.
Pelo
nome do Kimbanda, “Francisco Manicongo”, podemos nitidamente saber de onde se
origina, sendo a palavra “Manicongo” originaria do Reino do Kongo, muito
utilizado como titulo de pessoas de grande importância, no Reino do Kongo,
existente do século XIV ao XIX, com os governantes do Bakongo.
O
termo “Manicongo”, de acordo com minha insistência nas pesquisas, me deparei
com a seguinte explicação; Manicongo, cuja escrita correta é Mani Kongo, é uma
corruptela da palavra “Mwene Kongo”, em Kikongo, cujo seu significado é “Senhor
do Kongo”. O termo “wene” refere tanto ao reino quanto a cada uma das unidades territoriais
que o integravam. Os senhores das wene eram chamados de “Mwene”, sendo que o
Manicongo era o Mwene mais poderoso do reino, reconhecido como rei (ntinu)
pelos portugueses, desde sua chegada em 1484.
O
Manicongo residia na cidade, capital do reino, conhecida como Mbaza Kongo, de
onde nomeava os governadores das províncias e recolhia os impostos apropriados.
Como
explicito nos dois parágrafos acima sobre a origem e a importância da palavra
“Manicongo”, podemos concluir convictos de coerência que essa palavra que
compõe o nome de Francisco, retrata apenas a sua importância como Kimbanda,
destacando principalmente a sua terra natal. Ou seja, um Kimbanda ou Nganga,
ambos os Sacerdotes independentes do gênero, não ocupam postos de reis ou
rainhas, apenas atua junto dos mesmos quando solicitados, em serviços de cura,
proteção, até mesmo contra ataque aos inimigos. Mas, pra ter melhor convicção
sobre o termo Manikongo e pra precaver as conclusões sobre a profissão do
Kimbanda Francisco Manicongo, demos continuidade nas pesquisas.
Para
melhor compreendermos sobre a palavra “MANICONGO”, fizemos uma longa pesquisa
literária pra coerentemente validar a origem aqui exposta e tentar compreender
a profissão do Francisco Manicongo.
De
acordo com Patrício Batsikama (2010), a palavra MANICONGO não tem o mesmo
significado que a palavra “REI” na Europa e introduzido no Reino do Kongo, como
se pode encontra nos dicionários com o significado de: quem governa um reino.
E, muito menos da mesma forma que os Missionários e Cronistas quando escreveram
sobre o Reino do Kongo, classificando o Senhor de Mbanza Kongo como um
REI-EUROPEU, ou seja, como CHEFE-DIVINO (2010: 106).
Patrício
Batsikama (2010) nos informa que, os europeus fizeram a imagem do SENHOR DO
KONGO com a imagem do REI-EUROPEU, baseando-se nas insígnias utilizadas pelo
Mani Kongo, da pele de leopardo usado por eles, cujas cores brancas encontradas
significam o direito a vida e a preta significa a morte, perante todo o seu
reino, justificando assim, o Mani Kongo portador de um poder divino.
Ntinu
e Ntotila são um termo que antecede o nome dos “Senhores de Mbanza Kongo”.
Esses dois termos foram os únicos reservados aos Senhores de Mbanza Kongo. Mas
os termos Mani e Mwene podem ser encontrados antecedendo o nome de aldeias,
distrito, território ou província.
Seguindo
esse mesmo autor, o termo REI e seus atributos significativos para os europeus,
nada tem em comum próximo com o termo MANI, muito menos com NTOTILA,
principalmente, nem tão pouco parecido com o significado dos termos NTINU ou
MWENE.
“No
pensamento dos Kongo, o Senhor de Mbânza-Kôngo é, antes de mais, um chefe,
representante dos Ancestrais e eleito pelos Makôtas mais velhos. Portanto,
perante o povo, ele tem estas responsabilidades” (Batsikama, 2010: 106, 107):
1)”MÂNI e NTÔTILA que indicam
que este chefe é a pessoa indicada para resolver os problemas jurídicos, ou de
outra natureza, dos cidadãos. Jan Van Wing escreve no seu livro Etudes Bakongo I que, até no século XIX,
os Ambúndu vinham resolver os
problemas jurídicas e/ou outras discussões em Mbãzi’a Nkânu, a capital do
NTÔTIL’A KONGO;
2)MWÊNE que garante a economia.
Kôngo foi um povo dependente dos produtos da sua terra. Cultivava o solo,
incluindo as ovelhas” (Batsikama, 2010: 107).
Como
se pode constar, a partícula MA de MANI ou NE de MWÊNE, ou mesmo o termo
completo de MANI ou MWÊNE, que se encontra antecedendo os nomes de aldeia,
distrito, território ou província, revela que o grau de autoridade do individuo
antecede o seu local de atuação. Por exemplo: “Mani-Nsônso, Mwêne-Nsôyo,
Mani-Mpânu, Muêne-Mbâmba, Mwêne-Nsûndi, Mani-Zômbo, etc. Porem, não implica que
todos eles sejam Reis” (Batsikama, 2010: 107).
Segundo
Patrício Batsikama,
“O grau de autoridade é também
revelado no plano administrativo que ocupa a região. Por exemplo: Nsûndi é uma
província, Mpûmbu um território dentro de Nsûndi, Mpângu uma aldeia dentro do
território Mpûmbu. Ora, ao escrever, os Missionários e Cronistas –
desconhecendo esses usos – qualificaram todos (que Mani Nsûndi, quer Mani
Mpûmbu, quer Mani Mpângu, etc.), independentemente dos Reis de Nsûndi, Mpûmbu,
de Mpângu, etc.” (2010: 107).
Com
base nas pesquisas e centralização no termo MANICONGO, constatamos que mesmo
que o Kimbanda Francisco Manicongo tenha sido batizado, ou sido apelidado com o
nome de origem portuguesa, Francisco, o seu sobrenome revela a sua origem e
função profissional.
Mani
tem o significado de chefe, cujo portador deste termo é a pessoa mais indicada
para resolver os problemas jurídicos, ou de outra natureza, dos cidadãos do
Kongo. Assim concluímos que Francisco Manicongo exercia a função de Kimbanda,
resolvia os problemas espirituais, de saúde e se caso precisassem, os casos
jurídicos, como a própria população Kongo classifica aqueles que carregam o
termo MANI. O termo CONGO cuja grafia correta é KONGO, designa o seu local de
origem, o Reino do Kongo.
Segundo
Luiz Mott (2006: 13) no arquivo Nacional da Torre do Tombo de Lisboa, existe
mais de quarenta mil processos da Inquisição Portuguesa, datado entre 1536 a 1821. Arquivos bem
conservados entre outras preciosidades. Manuscritos que proporciona a
reconstituição da etno-história luso-afro-brasileira.
Os
arquivos, processos da Inquisição Portuguesa, são denuncias, sumários,
confissões e processos relativos aos crimes do conhecimento do Santo Oficio,
desvios da fé como; heresia, judaísmo, blasfêmia, pacto com o demônio,
feitiçaria e desvios contra a moral como; sodomia, bigamia e solicitação para
atos torpes feita pelo sacerdote no confessionário (Mott. 2006: 13).
De
acordo com Luiz Mott, a presença de feiticeiros no Estado da Bahia, assim como em outros Estados do
Brasil, como; Minas Gerais, Pernambuco, Paraíba, provavelmente em outros
estados, como; Rio de Janeiro e Espírito Santo, foram encontrados nos arquivos
da Inquisição Portuguesa, denuncias e depoimentos relativos a presença de
feiticeiros e sacerdotes oriundos do Reino de Ndongo (antigo reino onde hoje é
atual Angola) e do Reino do Kongo, atuando na Capitania da Bahia.
Registrado
nesses arquivos, se encontra muitos feiticeiros e sacerdotes, como; o angolano
Domingos Umbata, ex-cativo de um capitão de Porto Seguro, Bahia, que atuava
como Kimbanda; os angolanos Manoel e João, escravos do Convento dos Capuchinos
da Piedade, Salvador, Bahia; a angolana Luiza Pinta, alforriada, ex-escrava de
Manuel Lopes de Barros em Sabará, Minas Gerais; o angolano Caetano que atuava
como Kimbanda em Mariana, Minas Gerais; o angolano Damião, no Engenho de
Camuratuba, aldeia de Jacoqua em Paraíba; o congolense Domingos, Engenho de
Camuratuba, aldeia de Jacoqua em Paraíba; a angolana Barbara, Ipojuca, Engenho
Coité em Pernambuco; o angolense Antonio, escravo de Luis Barbosa Lagares, de
Paropeba em Minas Gerais ; a angolense Domingas, parteira e adivinhadora,
em Nossa Senhora
da Conceição dos Raposos, Sabará, Minas Gerais; o angolense Gonçalo, ex-escravo
do Arraial de São Sebastião, em Nossa Senhora do Sumidouro, Minas Gerais; o
angolense Antonio Angola de Lavras em Minas Gerais ; o angolense Roque e Brígida,
casada, em Itapecerica na Vila de Nossa Senhora Piedade de Pitangui em Minas Gerais ; o
angolense Francisco, escravo de Manoel Bernardes de Cristo, morador na Vila de
São João Del Rei em Minas
Gerais ; o benguelense Francisco, de nação benguela, escravo
de Ana Maria de Santa Rosa, residia na freguesia de Mariana, no Arraial de São
Sebastião, em Minas
Gerais ; o angolense Domingos, escravo de Manoel Carvalho em
Mariana, Minas Gerais; e, o congolense Antonio, morador de Mariana em Minas Gerais.
Um grande abraço aos amigos!
Tata Kitalehoxi!
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